A poesia pulsa
Poema escrito em 2015 para Tanussi Cardoso ano em que ele foi o poeta homenageado na XXIII edição do Congresso Brasileiro de Poesia, em Bento Gonçalves-RS
aqui
a poesia pulsa
na veia
no vinho
no peito
no pulso
na pele
nos nervos
nos músculos
nos ossos
posso falar o que sinto
posso sentir o que posso
aqui
a poesia pulsa
nas coisas
nos códigos
nos signos
os significantes
os significados
aqui
a poesia pulsa
na pele da minha blusa
na íris dos olhos da minha musa
toda vez que ela me usa
nas iguarias de Bento
quando trampo mais não troco
quando troco mas não trapo
nas pipas
nos vinhedos nos arcos
nas madrugadas dos bares
sampleando bolero in blues
rasgado num guardanapo
o poema pra Juliana
escrito na cama do quarto
no copo de vinho
na boca de Vênus
na bola da vez da sinuca
sangrada pelo meu taco
aqui
a poesia pulsa
nos cabelos brancos da barba
nas gargalhadas de Bacca
na divina língua de Baco
Artur Gomes
O Poeta Enquanto Coisa
Editora Litteralux - 2020
v(l)er mais no blog Congresso Brasileiro de Poesia
https://fulinaimicamente.blogspot.com/
e na página do face
Artur Gomes
Nunca escondi de ninguém que o “chapéu” do Congresso Brasileiro de Poesia é muito grande para caber apenas em uma cabeça. Ao longo das suas 24 edições, foram muitas as cabeças que me ajudaram a fazer dele um dos maiores eventos de poesia da América Latina. Artur Gomes não participou das edições iniciais, acontecidas em Nova Prata, mas foram raras as vezes em que ele não esteve ao meu lado a partir da transferência do evento para Bento Gonçalves. Professor, poeta, ator, produtor cultural com inúmeros serviços prestados à cultura brasileira a partir da sua base, a cidade de Campos, interior do Rio de Janeiro, tem 14 livros de poesia publicados e participações em dezenas de antologias, no Brasil e no exterior. Ao lado de Hugo Pontes e Tchello d’e Barros, foi articulador da Mostra Internacional de Poesia Visual, realizada paralelamente ao Congresso Brasileiro de Poesia. Tenho grande admiração pelo seu trabalho e pela pessoa que é. Ajudou-me a abrir portas importantes que muito contribuíram para o sucesso do nosso evento. É uma das mais fortes vozes da poesia marginal no Brasil.
Ademir Antônio Bacca
In Janelas da Memória (2020)
Fulinaíma Sax Blues Poesia
Artur Gomes, Dalton /Freire, Luiz Ribeiro, Naiman e Reubes Pess
lançado em 2002
ARTUR GOMES DE NOVO
por Ademir Bacca
Já deixei escrito em algum canto deste meu blog a admiração que tenho pelo
poeta ARTUR GOMES, sem dúvidas hoje o grande nome da poesia alternativa
brasileira. O Cd dele “Fulinaíma Sax, Blues & Poesia”, já gastou de tanto
que rodou aqui em casa. Há muitos anos venho ouvindo belíssimos poemas ditos
por ele, seja no Congresso Brasileiro de Poesia, no bar da esquina do SESC ou
mesmo aqui em casa, nas vezes em que ele está em Bento Gonçalves e nos damos o
prazer de conversar inúmeras garrafas de vinho e uma picanha no disco.
Gosto de muitos, mas este poema é, sem dúvidas, o meu preferido:
Alucinações Interpo(É)ticas
o que é que mora em tua boca Bia?
um deus um anjo ou muitos dentes claros
como os olhos do diabo
e um a estrela como guia?
o que é que arde em tua boca Bia?
azeite sal pimenta e alho
réstias de cebola
um cheiro azedo de cozinha
tua boca é como a minha?
o que é que pulsa em tua boca Bia?
mar de eternas ondas
que covardes não navegam
rios de águas sujas
onde os peixes se apagam
ou um fogo cada vez mais Dante
como este em minha boca
de poeta delirante
nesta noite cada vez mais dia
em que acendo os meus infernos
em tua boca Bia?
© ARTUR GOMES
Obs.: O CD Fulinaíma Sax Blues Poesia, foi lanaçado no Congresso Brasileiro de Poesia, em sua décima edição, outubro de 2022
Congresso Brasileiro De Poesia
Depoimento de Tanussi Cardoso
Para mim, foi o grande evento cultural, literário e poético que aconteceu nas últimas décadas no Brasil. Um encontro mágico entre várias linguagens e de união entre poetas de diversos países.
Foi a partir do Congresso de Bento Gonçalves-RS que minha carreira internacional começou, quando conheci a poeta mexicana Angelica Santa Olaya e o poeta chileno Leo Lobos.
Com eles, e com minha poesia, fui ao México duas vezes, convidado pela maior Universidade da América Latina, a UNAM, onde lancei o "Exercício do Olhar"; que fui convidado para vários festivais e feiras culturais no Peru, no Chile, na Argentina etc.
Como consequência, os convites de editoras para traduzir meus livros, lançar livros novos e para traduzir outros poetas de língua espanhola. Devo isso, principalmente, ao Ademir Bacca, ao Artur Gomes, a Telma Costa, a Juddu Saldanha, entre outros.
Semana passada, foi publicado meu mais recente livro, "O TEMPO SOBRE OS TELHADOS", pela Abra Canarias, na Islas Canarias, Espanha. Com certeza, a origem dele nasceu em Bento, Gonlaves-RS no Congresso Brasileiro de Poesia, criado e coordenado pelo Ademir Antônio Bacca. Assim, toda a minha gratidão a esse evento, inigualável, pela sua diversidade e qualidade. Torcendo pelo seu retorno a nossa vida cultural o mais breve possível.
com os dentes cravados na memória
O primeiro Congresso em Bento a gente nunca esquece. Na foto
(1997), estão - entre outras pessoas - os poetas visuais Clemente Padin
(Uruguay), Cesar Pereira (Brasil), Hugo Pontes (Brasil), Julien Blaine (França)
e Tchello d'Barros (Brasil)(de preto). Após o sarau que fizemos no trem Maria
Fumaça, declamando poemas aos cerca de 400 turistas que lotavam os vagões!
Tertúlia inesquecível!
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A CEREJEIRA DOS POETAS
Iara Schmegel me pediu dia desses que eu postasse uma foto atual da cerejeira plantada pelos poetas que participaram do XXIV Congresso Brasileiro de Poesia, em 2016. Aí está ela, na praça ao lado do Sopping Bento Gonçalves.
Ademir Bacca
De 1996 a 2016 o Congresso Brasileiro de Poesia foi para mim, um laboratório de criação poética de múltiplas linguagens, lá realizei performances, dirigi oficinas, fiz curadorias de mostras de poesia visual e cine.vídeo.poesia, coordenei saraus e lancei o livro SagaraNAgens Fulinaímicas em 2015 prefaciado por Tanussi Cardoso . Com a convivência com alguns imigrantes italianos que conheci em Bento Gonçalves, me despertou o desejo de ler e pesquisar sobre mitologia grega, e a partir dessas leituras escrevi o livro Juras Secretas lançado em 2018.
Conheci uma infinidade de poetas, brasileiros e latino americanos, com os quais mantenho contado até os dias atuais.
Artur Gomes
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Lembranças do Congresso Brasileiro de Poesia
Bento Gonçalves-RS - 2015
*
Jura secreta 16
para may pasquetti
fosse esta menina Monalisa
ou se não fosse apenas brisa
diante da menina dos meus olhos
com esse mar azul nos olhos teus
não sei se MichelÂngelo
Da Vinci Dalí ou Portinari
te anteviram
no instante maior da criação
pintura de um arquiteto grego
quem sabe até filha de Zeus
e eu Narciso amante dos espelhos
procuro um espelho em minha face
para ver se os teus olhos
já estão dentro dos meus
Artur Gomes
do livro Juras Secretas
Editora Penalux - 2018
https://secretasjuras.blogspot.com/
Este poema foi escrito em 2006. Quando cheguei a Bento Gonçalves, para dirigir uma Oficina de Poesia Falada no CEFET-Bento, encontrei a May Pasquetty na porta do Hotel VinoCap me esperando. Ela já havia me visto falando poesia pelas Escolas da cidade. Me passou mensagens por e-mail dizendo-me que um de seus sonhos era falar poesia no palco junto comigo. E em 2006 subimos no palco juntos, numa homenagem que fizemos para o Centenário do poeta Mário Quintana. Depois foram mais 10 anos de parcerias nas performances e recitais no Congresso Brasileiro de Poesia.
Em 2007/2008 foi minha parceira na performance O Amor Em Estado de Vinho e Uva que fizemos durante a programação da FENAVINHO. Neste ano foi a primeira vez que interpretei poemas do poeta e padre Oscar Bertoldo, assassinado barbaramente na região serrana do Rio Grande do Sul.
PoÉtica 42
poema do livro O Poeta Enquanto Coisa, que será lançado este ano pela Editora Penalux. Escrito em Bento Gonçalves -RS em setembro de 2016 durante a programação do XXIV Congresso Brasileiro de Poesia, depois de uma noite anterior, muito bem vivida, regada a filosofias de uvas e vinhos e a visita que fizemos ao Ateliê do lapidador de pedras, Mauri Menegotto. Aprendi com Oscar Bertholdo, que somos anjos sagrados, quase padres, ao falar em poesia, do amor carnal que existe entre a uva e o vinho que nasce da sua carne.
Poética 42
Era uma menina vestida de outubro
atravessando a rua
com um girassol no seu vestido
suas mãos beijavam o vento
como fossem lábios
de um beija-flor
meus olhos mergulhados
na paisagem
entre os olhos da menina
e o espelho do retrovisor
foto.grafei naquela tarde
a cor do seu vestido
e o girassol daquele dia
para me habitarem
seja lá por onde eu for
Artur Gomes
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https://fulinaimacarnavalhagumes.blogspot.com/
Com os Dentes Cravados Na Memória
Ronaldo Werneck - Poeta homenageado no XXII
Congresso Brasileiro de Poesia - outubro – 2014
vegetais
face a face
a alegria
da verde alface
rotundos
brilhantes
pesquiso
a poesia
do pálido palmito
sobre a mesa
descubro
a selvagem
tristeza
do tomate rubro
Ronaldo Werneck
“Creio que talvez possamos admitir que exista um movimento artístico intitulado “pós-modernismo” e que sua característica primordial seja a intertextualidade, ou a explicação do diálogo que estabelece com própria arte. Explicação porque não só admite mas mesmo denuncia sua filiação. Nesse sentido, pós-moderno é Ronaldo Werneck, que em 1976 lançou a primeira edição, agora revisitada, de(ste) Selva Selvaggia.” Assim começa Luiz Ruffato a apresentação do poeta-cinético ressaltando seu “barbarismo” fundado no “pensamento concretista”, um oxímoro...
“Sua poesia, que nos suga e seduz, é a da palavra, posta a serviço da própria palavra, recriando outra –sua metamorfose”, completa Lina Tâmega Del Pelaso.
Vem recomendado pelo também mineiro Ronaldo Cagiano... mas Ronaldo é já conhecido de todos, mesmo dos que desconhecem a sua intrigante obra. E antes que me esqueça, ele também é de Cataguases, terra da eterna modernidade...
Antonio Miranda
Abaixo Assinado pelo Retorno do Congresso
Brasileiro de Poesia em Bento Gonçalves-RS
Pelo exposto abaixo, por tudo isso e por muito mais
Pelas madrugadas no VinoCap as incursões pelo vale dos
vinhedos, as viagens pelo caminho de Pedras, a visita ao ateliê do Mauri
Menegotto, os Recitais de Poesia nas Escolas, os Saraus no VinoCap e na
Fundação Casa das Artes, Poesia na Vidraça, Poesia Uma Hora Dessas, nas ruas,
no chafariz que jorra vinho em frente a Prefeitura, as intervenções poéticas em
todas as esquinas de Bento. Por tudo isso e muito mais, conclamo um abaixo
assinado para o retorno imediato do Congresso Brasileiro de Poesia.
Na sua XXIV Edição o Congresso Brasileiro de Poesia homenageou o poeta Hugo Pontes, e em sua XXV homenagearia os poetas Artur Gomes e Jiddu Saldanha, os motivos pelos quais essa edição deixou de existir em 2017 não nos interessa, o fato é que o Congresso Brasileiro de Poesia precisa voltar a ser realizado para continuar a cumprir o seu papel de difusão da Poesia nas Escolas e em todos os cantos e recantos das cidades que desejem ser reconhecidas como veraCidades.
Federico Baudelaire
Primeiro de Maio de 1979. Vinícius de Moraes leu, emocionado, o poema “Operário em Construção”, de sua autoria, a pedido do então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luiz Inácio Lula da Silva.
“Os seus irmãos que morreram, por outros que viverão, uma esperança sincera cresceu no seu coração…”.
Operário em Construção
Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as asas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia por exemplo
Que a casa de um homem e' um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa quer ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
De fato como podia
Um operário em construção
Compreender porque um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Alem uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse eventualmente
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
`A mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garrafa, prato, facão
Era ele quem fazia
Ele, um humilde operário
Um operário em construção.
Olhou em torno: a gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro dessa compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois alem do que sabia
- Exercer a profissão -
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.
E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia "sim"
Começam a dizer "não"
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução
Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão
Mas o patrão nao queria
Nenhuma preocupação.
- "Convençam-no" do contrário
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isto sorria.
Dia seguinte o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu por destinado
Sua primeira agressão
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!
Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras seguiram
Muitas outras seguirão
Porem, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.
Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobra-lo de modo contrário
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
- Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher
Portanto, tudo o que ver
Sera' teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.
Disse e fitou o operário
Que olhava e refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria
O operário via casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!
- Loucura! - gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
- Mentira! - disse o operário
Não podes dar-me o que e' meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silencio apavorado
Com o medo em solidão
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arratarem no chão
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porem que fizera
Em operário construído
O operário em construção
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