domingo, 26 de março de 2023

Artur Gomes e Federika Lispector

a tarde arde como gengibre na carne da boca faz tempo não pedalo pelo litoral com a língua alvoroçada na espuma das marés em guaxindiba sempre encontro motivo para os dentes lábios e dedos carne de caranguejo no meio do beijo tem uma mulher de Itaocara passeando por aqui saudades da minha amiga de Recife e da sua filha em Rio das Ostras onde vaza sob meus pés o poema inacabado agora me vens de Salvador todo desejo toda fúria incontrolável como cavalo selvagem que se desprendeu da cela.

 

Artur Gomes

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um dia desses
quero ser Sérgio Sampaio
porque hoje tô de bode
na cabeça um para raio
tô comigo ninguém pode
soltando bichos no porão
tô faísca tô kabrunco
tô um relâmpago lamparão

Federika Lispector


DialÉtica
para Federico Baudelaire Lys Cabral e Federika Lispector

um dia desses
não quero ser Paulo Leminski
nem dançar como Nijinski
ou escrever feito Pessoa
numa boa

quero voltar a Curitiba
e sair da pindaíba
escancarar o Beleléu
quero ouvir Carlos Careqa
esse - Filho de Ninguém
e botar fogo no céu
onde o anjo diz: Amém!

quero ser o Nego Dito
ou será o Benedito
do Itamar da Assumpção

um dia desses
quero ser um João Gilberto
e quem sabe Caetano
pra cantar em Salvador
quero ser um Pai de Santo
fazer de Lys a minha flor

um dia desses
quero ser um Celso Borges
quero ser um Cláudio Willer
quero ser Eliakin
um Ademir Assunção
quero ser sempre Plural
estar sempre em profusão

um dia desses
quero ser Zeca Baleiro
pra dançar Boi no Terreiro
com Salgado Maranhão

Artur Gomes

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sexta-feira, 17 de março de 2023

a flor da pele


 o que existe por trás da poesia

- língua de sal lambendo a pele
do amor a flor da pele -


vou te roubar num poema -
doce incesto -
eu sei mesmo que não presto.

Federika Lispector


osso duro de roer

o meu corpo não é só
carne
pele
pelo
osso

no meu corpo
tem buracos
de entradas e saídas

para o que é preciso sair
e para o que é preciso entrar

Federika Lispector


 santíssima


sou filha
de uma santíssima trindade
pai
filha
espírito santo

no corpo sou carne/barro
no sangue veracidade
tenho um fogo que não se apaga
nem por Oswald de Andrade

Gigi Mocidade
- Rainha da Bateria da Mocidade Independente de Padre Olivácio - A Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo

www.porradalirica.blogspot.com



pound anas

 

pound anas

quero uma luz que me faça ver
na ana o que não é clara
e na clara o que não é gema
quero o poema da palavra escrita
maldita a dor de ainda ser poeta
quero a concreta carne da disputa
a bendita flecha do desejo
almejo o que não é seguro
o passo colocado em risco
a lâmina o abismo o cadafalso
quero uma luz que me faça ver
no escuro o que ainda não é claro
quando me deparo com a coisa
busco sempre entender o que ela é
as vezes é um mar tão profundo
que assim mesmo mergulho
mesmo sabendo que não vai dar pé.


Artur Gomes

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os silêncios da fala


 Magnífico poema de Maria Teresa Horta que me chega nesta manhã via minha querida amiga e inter/locutora La Bohéme para romper todos os sóis e seus silêncios. e essa imagem instigante me leva também a este poema do meu querido Artur Gomes


a face oculta da maçã
duas partes que se abrem pêssegos
campos de girassóis teus pelos
alvoroçados sob o sol de Amisterdã
enquanto isso em teus mamilos penso
o que ainda não comi desta maçã

Há sons que não se sentem... tantos silêncios que nos falam, e tão poucos os que ouvimos... Em silêncio, as mentes fluem nos "Silêncios de silex...", viajam nos "Silêncios de vento..." e visualizam na imagética dos "gemidos nas camas, As ancas, O sabor..."

OS SILÊNCIOS DA FALA

São tantos
os silêncios da fala

De sede
De saliva
De suor

Silêncios de silex
no corpo do silêncio

Silêncios de vento
de mar
e de torpor

De amor

Depois, há as jarras
com rosas de silêncio

Os gemidos
nas camas

As ancas
O sabor

O silêncio que posto
em cima do silêncio
usurpa do silêncio o seu magro labor

Maria Teresa Horta
Photography by Mariah
_________________________
Ahhhhhh, então, olho e torno a olhar e...olho outra vez... e vejo que, não é por acaso que a maçã é um ícone do pecado!... Espetacular. Tudo incluso, poema lindo e de uma malícia intrigante...

 

Rúbia Querubim

https://arturfulinaima.blogspot.com/

triste bahia

 

Musas serão sempre eternamente Musas

Triste Bahia

a música de Caetano desse tempo
me remete a Londres e Gregório de Mattos
em tudo que Caetano cantava
em tudo o que Gregório dizia
um tempo que me leva a Carolina
chegada da Argentina direto no Farol
com sua pele de luz
e seus cabelos de sol

o tempo tem seus relógios
e todo o mar tem areia
estrelas conchas e luas
reflexo de luz em suas algas

vejo ainda Carolina na rede da varanda
com os olhos fixos no mar
como iria me esquecer
como não iria me lembrar?

o tempo é como uma caixinha de música
onde deixamos oculto no inconsciente
o melhor dos sentimentos
e quando a caixinha abre suas janelas
o que ali ficou guardado não será mais segredo
está aberto pra história
vem para a flor da pele
ao nosso lugar da memória .

Artur Gomes

www.fulinaimagens.blogspot.com


Auto-retrato

Oh não passar somente sugerido!
Desespero de nunca ver o anjo
Não conhecer nem mesmo a rosa e o lírio
Ter medo e ter vergonha ajoelhado
Querer ser puro e sempre ver-se impuro
A espera da morte a incerteza
A secreta esperança de ficar
A pétala da rosa sob a cota
O endereço guardado sobre o peito
Ver navios que chegam e vão sozinhos
E depois de tanta dor e tanta angústia
Pensar ter dado a luz a algo vivo
E levantar-se apenas com o poema.

- Mário Faustino
(18 abr. 1948)


antropofagicamente

 

 Antropofagicamente


comerás da minha pa/lavra/carne
mastigarás todos nervos e músculos
e matarás tua fome
esse desejo não tem nome
e me consome esta vontade
de ser devorada de verdade
pelos teus dentes de sede
pelos teus dedos de seda
pelos teus poros na rede
sem que até mesmo percebas
se o que tu comes é saudade

Federika Lispector

www.personasarturianas.blogspot.com

com um prazer de fera

 

com um prazer de fera

e um punhal de amante

na cachoeira da fumaça

do espírito santo

eu canto tua carne viva

em minha pele crua



a massa um dia

ainda comerá

os biscoitos finos que fabrico

Oswald de Andrade


eu tenho a flor aberta
entre as coxas
deixo a luz entrar

Gigi Mocidade

quinta-feira, 16 de março de 2023

Geleia Geral - Rádio Caiana

 

Hoje às 20h

Geleia Geral

Rádio Caiana

www.radiocaiana.com.br

 

Gravamos ontem com Paulo André Netto Barbosa o primeiro Geleia Geral com participação especialíssima da minha querida amiga parceira Marcella Roza cantando à capela Vapor Barato (Jards Macalé/Wally Salomão).

Além de uma seleta musical com meus parceiros Paulo Celso Ciranda Reubes Pess Otávio Cabral Naiman e Luiz Ribeiro e duas faixas com poesia e som instrumental de Fil Buc fluiu ainda um breve bate papo focado na minha trajetória desses 50 anos de poesia. Esse programa de estreia vai ao Ar hoje às 20h.


sábado, 4 de março de 2023

múltiplas póeticas

Hoje no Café da Manhã da FCJOL

tem poesia para Gabrielle

Quem mandou matar Marielle?

 Terra

antes que alguém morra

escrevo prevendo a morte

arriscando a vida

antes que seja tarde

e que a língua da minha boca

não cubra mais tua ferida

 Artur Gomes

Pátria A(r)mada

Desconcertos Editora – 2022

leia mais no blog www.fulinaimagens.blogspot.com

 


Teatro do Absurdo

 

O quarteto da hipotenusa

versus o quadrado do quarteto

da hipotenusa a musa do quadrado

fosse apenas o retrato na fotografia

mas não sendo hipotenusa

somente musa algaravia

uma palavra mais que estrada

sendo musa multi-via

me levou nessa jornada

para fora da Bahia

todos os santos mar aberto

no abismo a fantasia

de querer mus entretanto

muito mais que poesia 


e ela vai pintando

 o homem com a flor na boca

com seus pincéis de aquarela

poema que só é possível

pelas lentes dos olhos dela

 

na balada ou no bolero

nossas letras se entrelaçaram

pele corpo carne sangue pelos

poros entre tintas entre tantos

anos que  foram pintados

sobre papéis de cartas em fogo

sob o sol  chuva verão inverno

quando qualquer das estações

é primavera

 

e ela era uma estudante de arquitetura que pintou poemas no cachorro louco

e desenhou imagens em Brazilírica Pereira : A Traição das Metáforas 


Artur Gomes 

O Homem Com A Flor Na Boca 

https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/


 

O Auto do Boi Macutraia

 

por onde andará

Macunaíma

tá no rabo da sereia

tá no rabo da arraia

já passou por Gargaú

tomou pinga em Bracutaia

?

não  

 

Joilson Bessa  já me disse

Kapi do céu já ensaia

 Macunaíma  vem dançando

na farra do boi Macutraia

 

levanta meu boi levanta

que é hora de viajar

acorda boi povo todo

povo e boi tem de lutar

 

olha o rabo do boi é boi

a barriga do boi é boi

olha o chifre do boi é boi

e o couro do boi é boi

 

o meu boi é valente é boi

já chifrou o tenente é boi

é um boi de mercado é boi

e também o delegado é boi


e lá vem Toninho Xita

todos vestido de rosário

vai cantar mais  samba-enredo

pra enriquecer o relicário

 

ê meu boi brasileiro ê boi

pintadinho sem dinheiro ê boi

ê meu boi alazão ê boi

que chifrou o capetão ê boi

 

o meu boi é kabrunco é boi

o meu boi garrutio é boi

o meu boi lamparão ê boi

pra encantar a multidão é boi


o meu boi é jaguar é boi

mãe maria vem cantar vem boi

e meu boi sapatão ê boi

vem também pai joão vem boi

 

o meu boi julivete é boi

já comeu a micheque ê boi

e meu boi operário é boi

já chifrou salafrário ê boi 


o meu boi é cigano é boi

o meu boi é baiano é boi

é também pernambucano é boi

tá  no canto da sereia é boi

tá no rabo da arraia é boi

é um boi carnavalhado é boi

veste calça e veste saia é boi

eita boi da macutraia ê boi


o meu boi jaburu é boi

enfrentou o bangu ê boi

desfilou no ururau ê boi

e ganhou carnaval é boi 


esse boi sem segredo ê boi

esse boi não tem medo ê boi

se um dia passa fome ê boi

noutro dia nós vira samba-enredo

 

Artur Gomes

www.arturkabrunco.blogspot.com


Live em homenagem a Antônio Cícero

No próximo dia 23 às 16:hs à convite da minha amiga  Renata Barcellos BarcellArtes  estaremos nessa live em homenagem a memória de  Antônio ...