quarta-feira, 20 de março de 2024

múltiplas poéticas

no hotel amazonas - galvez o imperador do acre  hospedou-se  em  sua passagem por campos dos goytacazes em direção a vitória do espírito santo e deixou por aqui o vampiro goytacá que mora neste hotel até hoje e passa as madrugadas na janela do quarto olhando o pátio interno tentando reencontrar o seu amor benta pereira muitas vezes vi lágrimas descendo dos seus olhos e as mãos apontadas para o telhado do outro lado do corredor enquanto rezava para santo antônio e nina aroeira quando viu pelos corredores a linda  flor de florlisbella passos

 

Artur Gomes

Vampiro Goytacá 

https://arturgumes.blogspot.com/



Crônica do sertão mineiro

 

Em um quarto honesto de hotel

Um homem acorda suado

No meio da madrugada

Morna e quieta

de uma cidade

ao norte

que rasga o sertão.

Em um golpe

se livra

Do lençol,

De brancura e perfume

compatíveis

Com a diária

Que cabe em seu bolso.

Toda cama de hotel é imensa

Para um homem sozinho,

E antes que

O recapture o sono,

Ele imagina outro movimento:

Lentamente, indo ao chão,

o vestido justo,

Colado ao corpo

Da mulher que conheceu

Noite passada.

Quando enfim adormece,

Em sonho, a nudez

Dessa mulher

O leva em paz

Até o abandono

Do amanhecer.

 

André Giusti, Montes Claros – Brasília, outubro/2022   



 

todas as mulheres do mundo

 

 

com as mulheres do mundo,

que pensava em amar,

me descobri vazio,

um madeireiro a procurar

no bosque imenso e profundo

árvores que cortava sem vacilar.

advertiu-me um velho sábio:

o bosque há de acabar!

sem dar bola a tal conselho

continuei o machado a afiar.

dos golpes começaram a brotar

rebentos fortes, sadios.

eu, espantado, a especular:

o que neles era contido

que não saberia explicar?

de novo o velho sábio

veio comigo a conversar:

dos rebentos produzidos

há sua alma a clamar

perdão pelos golpes dados.

de volta ao bosque fui buscar

as árvores que tinha golpeado.

perdão queria implorar.

na primeira me vi avô,

na segunda, um filho a chorar

na terceira, um pai perdido

e na quarta, uma mãe a lamentar.

depois do bosque percorrido,

o crepúsculo a se aproximar,

nas mulheres que tinha amado

percebi que o presente a ganhar

era o que elas tinham gerado.

antes da noite terminar

veio o velho acompanhado

das orixás a me mostrar

que dos golpes que havia dado

só uma pessoa poderia magoar,

uma pessoa que era resultado

das mulheres que desejava amar,

todas contidas em mim mesmo

na figura de pai a buscar

a mãe que nunca teria sido.


*

 tudo começa num ponto

às vezes é o centro

equidistante

entre dois oceanos

às vezes

apenas um ponto

intersecção de duas linhas

um coração que bate

um ponto

onde tudo começou


                Cesar Augusto de Carvalho 


na casa da infância

tinha banho de tanque

galinhas dormiam no pé de manga

tinha boneca de espiga de milho

trem de madeira no chão de trilhos

 

na casa da infância

tinha porco no chiqueiro

pés de mamão no terreiro

tinha pão com marmelada

amarelinha na calçada

 

na casa da infância

se brincava de esconde-esconde

se fartava de fruta do conde

tinha papo no portão

quermesse de são joão

 

na casa da infância

tinha namoro na praça

crianças em arruaças

tinha arrasta pé

fumaça de chaminé

 

na casa da infância

tinha pés de alface

comida pra quem chegasse

tinha pé de uva

corrida na chuva

 

na casa da infância

tinha cerca de madeira

pé de jabuticabeira

tinha sol na varanda

pés de pitanga

 

na casa da infância

tinha café no bule

bolinhas de gude

e quase se morria

de tanta alegria

 

na casa da infância

tinha música de radiola

pés de amora

insetos no jardim

colorido de jasmins

 

na casa da infância

tinha muitos amigos

brincar era o maior perigo

tinha goteiras na sala

penduradas nas mandalas

 

na casa da infância

tinha galinha assada

papo solto rolava

tinha cheiro de cozinha

sorriso largo da vizinha

 

na casa da infância

a primeira namorada

tinha olhos de esmeralda

tudo era motivo pra brincadeira

até escorregar na bananeira

 

na casa da infância

tinha salada de frutas tantas

recheadas de boas lembranças

tinha o essencial

amor era o prato principal

 

na casa da infância

tudo valeu a pena

tinha vagalume de estrelas

céu de fazer poemas

 

na casa da infância

imensa gratidão

nem toda casa da infância

é assim não

 

Dinovaldo Gillioli



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